
ARTEMÍDIA URBANA
Reflexão e Análise Perceptiva da Parada Inglesa
6. Relação Didático-Metodologia da Arte e a Reflexão no Espaço Urbano
A Arte é entendida como instrumento facilitador no contexto didático-metodológico da sala de aula para compreensão expressiva e significativa das relações humanas, permitindo sua inserção social de maneira mais ampla.
O objetivo de utilizar os meios artísticos como um instrumento didático em sala de aula não tem como função primordial em formar artistas ou somente trabalhar aptidões, a proposta principal consiste em formar indivíduos conscientes para exercerem a cidadania, desenvolvendo suas capacidades de reflexão e crítica. Por isso, deve-se estimular a criação, invenção, produção, reconstrução e reinvenção como meio de um processo, e não como um produto final.
O desafio proposto pelo ensino por meios artísticos é contribuir para a construção do conhecimento por meio de uma nova realidade interpessoal. Assim, a arte, entendida como um instrumento pedagógico propõe novas leituras no meio em que as diferenças culturais são vistas como recursos que permitem ao indivíduo desenvolver seu próprio potencial criativo.
Capacidades criativas de um novo método adequado ao objeto “o trabalho interdisciplinar, tão discutido nos dias de hoje, não se estabelece confrontando disciplinas já constituídas (nenhuma das quais quer ceder terreno). Não é suficiente escolher um ‘tema’ e reunir e torno dele duas ou três ciências para realizar algo de interdisciplinar. A interdisciplinaridade consiste em criar-se um novo objeto que não pertença a ninguém”. (Barthes, 1984).
A arte urbana tem representado a identidade dos jovens na contemporaneidade. Trazê-la para o contexto escolar, conecta-la com o currículo, com a produção cultural já existente na escola e outras possibilidades são questões que o Instituto Choque Cultural (fig. 103) tem procurado responder por meio de cursos sobre linguagens da arte urbana (stencil, grafite, sticker, zine, etc); e elaboração de projetos de arte urbana em espaços educativos.
Os encontros promovidos pelo Instituto Cultural visam oferecer ferramentas ao professor para contribuir na aproximação dos interesses dos alunos e os da escola através da arte como mediadora, ou seja, contribuir para que o educador perceba a escola como um laboratório da cidade e seu papel como agente cultural na mediação das aprendizagens dos alunos para o exercício da cidadania e de seus direitos culturais. Estimular o processo criativo do professor e oferecer referências para a elaboração de um projeto de arte urbana na escola em colaboração.
O Eduqativo é o braço do Instituto Choque Cultural que trabalha diretamente com a formação de alunos e professores. Oferece cursos, extensões, workshops e acompanhamento para educadores, escolas e outros espaços educativos. O projeto busca incorporar novas linguagens artísticas e métodos de ensino à pedagogia contemporânea, partindo do conceito de que a escola é cidade e a cidade é escola.

“ A escola é cidade. (...)
A escola precisa acompanhar esse trânsito de conhecimentos que estão sendo produzidos. Precisa conhecer seu potencial pedagógico. Precisa construir novos sentidos, junto com os alunos.
A cidade é escola.”
(RIBEIRO, R. “A Escola é cidade: a cidade é escola”. 2015 p. 8-9)
Figura 103 - Instituto Choque Cultural e entrevista com Raquel Ribeiro. Visita dia 29/06/2016.

Fonte: foto da autora.
Na entrevista com Raquel Ribeiro, foi possível aprofundar os conhecimentos sobre Arte Urbana, sobre as políticas de Arte e as possibilidades de articulação entre os artistas contemporâneos. Fizemos uma visita pelo Beco do Batman (fig.104), que possibilitou uma vivência da arte em espaço urbano e suas múltiplas formas estéticas.
Um espaço que tomou projeção internacional com a presença do guitarrista do Rolling Stones, Ron Wood no Beco do Batman (23/02/2016), um dia antes dos shows da banda inglesa na capital paulista. No local o músico desenhou a famosa boca que é símbolo dos Stones (fig. 105).

Figura 104 - Beco do Batman. Visita guiada em entrevista com Raquel Ribeiro – Instituto Choque Cultural. Dia 29/06/2016.
Fonte: foto da autora.

Figura 105 - Beco do Batman. Visita guiada em entrevista com Raquel Ribeiro – Instituto Choque Cultural. Dia 29/06/2016.
Fonte: foto da autora.
Na entrevista cedida 26/06/2016, na Galeria do Instituto Choque Cultural e em seu livro “A Escola é a Cidade – A Cidade é a Escola”, a preocupação com o diálogo transparente com os jovens, por meio de um depoimento crítico sobre a produção de arte contemporânea e suas relações mercadológicas, bem como a formação de artistas e a possibilidade de artistas urbanos se estabelecerem como artistas.
Este trabalho faz uma apreciação do fenômeno do grafite, contextualizando o protagonismo adolescente na atividade de grafite como uma ação de cidadania na qual os jovens conseguem engajar-se e criar uma relação de pertencimento com o meio ambiente urbano.
Para ilustrar, a relação entre artistas, o grafite e a aceitação pública, Raquel nos apresentou o processo de fundação do MAAU – SP, Museu Aberto de Arte Urbana de São Paulo, a ideia surgiu a partir da prisão de onze grafiteiros que não possuíam autorização legal do Metrô para pintar nas pilastras.
Após a aprovação do projeto, foi criada uma parceria entre o Metrô, a Secretaria de Estado da Cultura, Paço das Artes e a Galeria Choque Cultural. A Secretaria do Estado da Cultura e o Metrô contribuíram com tinta e spray e revitalizaram as estruturas, os futuros painéis de 4 metros de altura.
Esta ação ilustra a modificação de paradigmas da Arte Urbana, que transita entre os espaços da rua, transformada em galeria de arte, bem como a importância dos meios virtuais.
Raquel ressaltou a importância política, cultural e social da Arte Urbana na contemporaneidade. Uma das ações que culminou na eleição de Haddad para a prefeitura de São Paulo, foi numa manifestação virtual intitulada “Existe Amor em SP”, que se consolidou em ato na Praça Roosevelt contra a prefeitura de Kassab e contra a candidatura de Celso Russomano.
A discussão sobre as novas linguagens e novas abordagens artísticas, se pautam no contexto urbano, suas relações no plano real e virtual, e como tais conceituações se configuram na sala de aula.


Figura 106 - Graffiti: Alex Hornest “Onesto”
Foto: Jonathan Duarte. Fonte: https://museuabertodearteurbana.wordpress.com/galeria/#jp-carousel-22
O MAAU constitui em um conjunto de 88 painéis de grafite instalados nos pilares que sustentam o trecho elevado da Linha 1 - Azul do Metrô de São Paulo, localizados no canteiro central da Avenida Cruzeiro do Sul entre as estações Santana e Portuguesa-Tietê, no distrito de Santana, Zona Norte de São Paulo. Esta região da cidade é considerada como berço do grafite paulistano desde os anos 1980 e 1990.
Iniciado no final do mês de setembro de 2011 o projeto contou com a presença de 58 artistas, como: Binho, Chivitz, Akeni, Minhau, Larkone, Onesto (fig. 106), Zezão, Higraff, Presto e Anjo, a maioria residente na região norte. Nos dez dias de trabalho foram usadas três mil latas de spray especial e 40 latas de 18 litros de látex. A temática das obras é variada: natureza, vida urbana e periferia.
Considerado o primeiro Museu Aberto de Arte Urbana do Brasil, o projeto viabilizou a criação de painéis coloridos com trabalhos inéditos de mais de 70 artistas de rua. Recentemente, foram feitas novas artes no canteiro central, onde participaram cerca de 25 artistas convidados, misturando seus estilos, conceitos e jeitos de grafitar.
Além disso, visa a recuperação do centro de Santana, hoje degradado, e o desenvolvimento ações educativas em escolas da região, com o intuito de aproximar este público à arte urbana.(fig. 107)
Após um ano da pintura dos painéis, iniciou-se a colocação de muretas e grades em toda a extensão do museu. Tal iniciativa provocou um descontentamento dos curadores, artistas, visitantes, moradores e comerciantes locais, que provocaram uma série de manifestações para a paralisação das obras, possibilitando a retirada das grades.

Figura 107 – Museu Aberto de Arte Urbana
O Museu Aberto de Arte Urbana de São Paulo percorre a Avenida Cruzeiro do Sul em três estações do Metrô da Linha 1 – Azul: Tietê, Carandiru e Santana, num trajeto de cerca de 1,5 km. Neste trajeto, podemos destacar o Terminal Rodoviário do Tietê, o Parque da Juventude e seus os equipamentos sociais e culturais: Biblioteca São Paulo, Etec Parque da Juventude e Etec das Artes, percurso que se encerra no Terminal de Ônibus de Santana.
A arte urbana propõe uma comunicação visual de forma impactante, seja por meio de críticas sociais, ou por meio da reflexão, utilizando diversas técnicas alternativas como moldes, pôsteres, adesivos, murais e grafite.
Durante a elaboração do trabalho, foi observada uma continuidade conceitual e gestáltica entre as estações Jardim São Paulo - Parada Inglesa – Tucuruvi, nas 10 pilastras existentes num trecho de 1,5 km. (fig. 108)
Foi pensada numa institucionalização e curadoria das pilastras na região da Parada Inglesa que já acontece com a colaboração do comércio de bares da região com a autorização do metrô.
Porém a discussão sobre o grafite tomou um novo viés na primeira semana de gestão do prefeito João Dória (2017) sob um programa intitulado “Cidade Linda” que declarou guerra contra os pichadores, grafiteiros e artistas de rua apagando o maior mural já registrado de grafite da América Latina na Avenida 23 de Maio. (fig 109)
Figura 108 – Ampliação do Museu Aberto de Arte Urbana

Fonte: GoogleMaps. https://www.google.com.br/maps/@-23.488952,-46.6098469,3a,39.2y,-7.44h,93.51t/data=!3m6!1e1!3m4!1sqTaQtbe0dlGA8RhnQHT9Zg!2e0!7i13312!8i6656?hl=pt-BR
Que culminou numa ação popular e deliberada numa liminar judicial contra o programa “Cidade Linda” como preconceituosa, autoritária e excludente de expressões culturais que buscam justamente a inserção social e a integração de pessoas com realidades e diferentes experiências. Princípios ou valores que, necessariamente, deveriam nortear as políticas da cultura e do desenvolvimento urbano.
Deve-se pensar que ao invés de excluir e marginalizar jovens de baixa renda pelo aumento da proibição, seria melhor acolhê-los em programas de desenvolvimento de suas habilidades artísticas, afastando-os do crime organizado.
Atualmente os artistas do grafite são convidados para participar de projetos que visam embelezar as cidades. O diálogo dos artistas com os moradores e a população em geral, colaboram para a cidadania, a relação de pertencimento e contemplação da paisagem urbana.

Figura 109 – Murais da Avenida 23 de maio cobertos pelo cinza em São Paulo
Fonte:https://oglobo.globo.com/brasil/doria-apaga-grafites-em-avenida-cria-polemica-em-sp 20815081#ixzz4hlb9dSZ7